Nos últimos anos fomos tomados de assombro pela Morte.
Morte de pessoas, de planos, de negócios e sonhos.
Nos indignamos com decisões, com idealismos e nos decepcionamos com pessoas. Muitos “morreram” para nós.
Outras vezes, a morte nos subtraiu crianças e jovens nos jogando no fundo do poço. Nestas horas, perdemos a fé na vida, nos valores que cremos, em tudo.
O que é a morte, afinal? E como resistir ou sequer existir diante do sofrimento de tamanha dor?
Há consolo em alguma doutrina? Há crenças que podem por um momento nos dar alívio. Nos agarramos a elas como uma tábua de salvação.
Mas ao olharmos a morte como um limite, pois é o que ela é concretamente, diante dela só podemos parar. A morte nos para. Nos impede de seguir com algo ou alguém ao nosso lado.
Não sabemos se a pessoa segue numa outra dimensão e nível de consciência. Mas sabemos que nós seguimos sem ela.
Se já tínhamos vivido até a velhice desta pessoa, isso é um consolo. Mas quando isso não ocorreu, nos sentimos roubados.
Como entender e suportar as mortes de vidas breves? Olhando para o sacrifício. No passado muitas crianças, virgens e jovens eram sacrificados em rituais. Hoje, as guerras, as drogas, a violência, os excessos são os carrascos dos rituais.
Não sabemos se os que se foram sofrem, mas os que ficam sim. Estes chegam no fundo do poço onde só tem um lugar para olhar: para cima.
O sofrimento traz profundidade.
Saímos da rasura da vida sem sentido e mergulhamos na busca de um sentido para o absurdo. Nos damos conta que o absurdo era a vida sem sentido que tínhamos antes.
No fundo do poço, nos ajoelhamos e pedimos clemência. Ali pedimos com a verdadeira fé. E quando somos dobrados por estas circunstâncias, a Misericórdia nos alcança. Nossa impotência nos humaniza e nos conecta a nossa alma e as verdades profundas e essenciais que ali estão. Neste momento somos abençoados com um sonho, uma visão, uma mensagem da alma leve que partiu.
Então, nunca mais seremos rasos. O profundo não sairá nunca mais de dentro de nós pois que só ali nos encontramos com nossos mortos. E honramos seus sacrifícios. Eles nos contam porque foram os escolhidos e como fizeram isso com amor. Para que possamos parar e sair do raso. Para nos inspirar a sermos leves como eles. Sem nenhum apego ou tábua que nos prenda a superfície.
O raso nunca mais nos atrairá com suas fantasias e promessas vãs de felicidade, beleza, juventude eterna, dinheiro e poder. Todas estas ilusões vendidas a nós e que não têm sentido.
Só o sofrimento nos traz profundidade.
Talvez só quem já passou por ele, conseguirá entender este texto.
(Silvana Garcia)