“Seu destino é maior que minha pena”.
Um médico não pode ter pena de operar alguém, assim como um policial não pode ter raiva de um bandido. Eles apenas cumprem seu papel, sem se envolver. Um amigo ou parente que se envolve demais não é a pessoa certa para ajudar ou criticar seu amigo ou parente.
Todo aquele que se envolve demais, está sentindo-se superior de algum modo. Crê que pode fazer mais pelo outro do que esta pessoa já tentou por si própria ou quer. As pessoas mais perigosas que existem são aquelas que pensam que podem e devem ajudar alguém. Oferecem, ensinam sem que o outro peça. Dão de graça desde comida até informações.
O outro pediu, “pagou” por isso, no sentido de uma troca?
Muitas pessoas dão uma amostra grátis como se fosse uma propaganda de seu trabalho, ok. Tem um objetivo claro. Outros fazem-se de bons, de sábios. É como se dissessem: “Estou dando comida, dinheiro ou conhecimento porque fui capaz de conquistar e você, pobrezinho, não foi.” Aí está o problema. A conduta de superioridade. De não respeitar o que o outro pode conquistar por si. Nem dar o peixe, nem ensinar a pescar, se não te pedirem. E, se pedirem, avaliar como esta troca seria justa. Ninguém é tão rico, que não tenha o que receber, nem tão pobre que não tenha o que oferecer.
Muitas vezes, ir levar comida para os pobres é culpa por toda omissão quanto ao desequilíbrio de riquezas. O que o governo faz para os pobres não é solidariedade, é obrigação. Ir na África e ser fotografado ajudando, não é amor, é vaidade. Passa num click.
Alguém gritando socorro pode ser uma emergência ou um assalto. Se não ouve sua intuição antes de agir movido às pressas, pode ser o próximo a pedir socorro de verdade. Ajudar ao necessitado que pede tem um grande valor. Dar a ele oportunidades, mais ainda. Querer ajudar para aliviar nossa pena, nenhum valor.
‘Seu destino também é maior que minha raiva’.
Isso significa que se alguém me toca ou incomoda tanto, na mesma proporção tem um peso sobre aquela pessoa (o destino dela com toda sua dor, loucura, expiação, etc.) é muito maior do que ela causa em mim. Então aceito que ela é assim, renuncio a querer ter o poder ou prepotência de ajudar ou mudar aquela pessoa e me afasto, porque se me mobiliza demais, já não sou a pessoa certa para “ajudar”.
(Silvana Garcia)